quarta-feira, 27 de agosto de 2008

DESAFIOS À PRESERVAÇÃO DA ÁGUA DE ABASTECIMENTO PÚBLICO (III)

Osmar Pires Martins Júnior*

O uso sustentável de bacias hidrográficas de mananciais de abastecimento público é um dos maiores desafios dos tempos modernos. O equacionamento do problema envolve fatores complexos que devem ser identificados e colocados numa ordem a mais correta possível para a obtenção de resultados satisfatórios. Uma questão prioritária é a demanda crescente para uma oferta limitada. Um nível razoável de satisfação do consumo doméstico e industrial requer uma demanda diária média de 250 litros por habitante. Porém, a disponibilidade hídrica no nosso meio é constituída de fontes de superfície que, para regimes hidrológicos continentais intertropicais, requer a preservação de uma bacia hidrográfica da ordem de 500km² para o abastecimento de uma metrópole do porte de Goiânia.


O explosivo crescimento populacional dos núcleos urbanos dos países emergentes e uma dinâmica populacional marcada por intensas necessidades sócio-econômicas pressionam a demanda, mas a disponibilidade para seu atendimento dependente de uma oferta limitada e sujeita à variação das precipitações pluviométricas, do uso e manejo do solo e da infra-estrutura de saneamento ambiental da bacia hidrográfica. Afinal, dos 44 milhões de m³/dia de água captados das fontes superficiais, são devolvidos 39 milhões de m³/dia de esgoto, sem tratamento. Isto equivale a cinco vezes o volume de água depositado anualmente na Baía de Guanabara. Em resumo, as fontes de superfície são deplecionadas nas extremidades da captação de água e do lançamento de efluentes poluidores, assim como no manejo inadequado da vertente, impactando negativamente todo o ciclo da água.

As condições intertropicais se caracterizam pela variação da vazão de chuva e de seca, bem como dos fatores dependentes do clima, solo e vegetação, estabelecendo regimes hidrológicos bastante críticos para o abastecimento das metrópoles brasileiras. Esta avaliação pode ser feita pela comparação das vazões dos cursos d'água que abastecem as populações de algumas cidades. As metrópoles localizadas em regiões de clima temperado apresentam uma relação entre demanda e disponibilidade hídrica bastante favorável. A região de Paris com 10 milhões de habitantes é abastecida pelo rio Sena, que possui vazão média de 300 m³/s no trecho parisiense. Roma possui 6,5milhões de habitantes abastecidos pelo rio Tibre, que tem vazão média de 360m³/s no trecho romano.

A vazão disponível nas cidades do nosso País é pequena comparativamente às situações de outras parte do mundo, como vistas. A metrópole goianiense com 1,2 milhão de moradores é abastecida pelo ribeirão João Leite que possui vazão média de 11,2m³/s (a contribuição da Alto Meia Ponte e a possível contribuição do Dourados e do Caldas não altera esse quadro relativo). A grande São Paulo, com quase 20 milhões de habitantes, está localizada na bacia do Alto Tietê, que possui vazão média de 90m³/s. Em termos comparativos, as metrópoles brasileiras são relativamente populosas e demandadoras de água, embora os mananciais que as drenam sejam menos caudalosos. Portanto, a relação entre oferta e demanda é bastante desfavorável. Em conseqüência, é real a perspectiva de agravamento da crise relativa no abastecimento de água. Estima-se que, em Goiânia, mantendo-se as atuais taxas de crescimento populacional, nas duas próximas décadas, caso não se efetivem programas de proteção dos mananciais, a demanda ultrapassará a capacidade-limite de oferta disponível na bacia hidrográfica de abastecimento.

Diante desse cenário, é fundamental implementar políticas de proteção dos mananciais da região metropolitana de Goiânia, a partir do planejamento, zoneamento e gerenciamento do território de toda bacia hidrográfica. As ferramentas para isso são o diagnóstico e o manejo sustentável do solo da bacia João Leite e não apenas do entorno do reservatório. A esse respeito, discorreremos no próximo artigo.

* Osmar Pires Martins Júnior é biólogo, engenheiro
agrônomo, mestre em ecologia, professor de cursos de graduação e
pós-graduação em IES, coordenou e integrou o estudo sobre o
diagnóstico ambiental e possibilidade de uso sustentável da bacia
hidrográfica João Leite, foi presidente da Agência Ambiental de
Goiás (2003-06), perito ambiental do MP-GO (1997-02), secretário
do Meio Ambiente de Goiânia (1993-96).

Sinais preocupantes

Artigo publicado na Folha de São Paulo (Marina Silva).



O movimento ambientalista conquistou respeito e apoio por defender as imensas riquezas naturais do Brasil e questionar o crescimento a qualquer custo. Hoje, com a sociedade mais atenta, e disso tive prova durante os anos em que estive à frente do Ministério do Meio Ambiente, temos uma poderosa união de esforços que dá base política para reposicionar o modelo predatório de uso de nossos ativos ambientais.

Essa base deu suporte ao governo do presidente Lula para adotar medidas contundentes de freio ao desmatamento na Amazônia. Decreto de dezembro de 2007 determinou a regularização fundiária nos 36 municípios de maior desmatamento, a responsabilização das cadeias produtivas e o agravamento das sanções em caso de descumprimento de embargo. Em janeiro, foi anunciada a operação Arco de Fogo, da Polícia Federal e do Ibama. Em fevereiro o Conselho Monetário Nacional editou resolução que condiciona o crédito rural na Amazônia à regularidade fundiária e ambiental da propriedade. Essa resolução entrou em vigor em 1º de julho e certamente contribuiu decisivamente para os primeiros resultados positivos, ainda que parciais, desse esforço.

No entanto, ao mesmo tempo, surgem sinais preocupantes de mudança na postura do governo. Primeiro, a edição da Medida Provisória 422, que estimula a grilagem de florestas públicas na Amazônia; depois, o veto presidencial ao único dispositivo que disciplinava minimamente a aplicação da MP. Recentemente, o governo anunciou acordo que, na prática, reduz a reserva legal na Amazônia para 50% e permite o plantio de espécies exóticas. Anunciou também a redução do ritmo de criação de unidades de conservação e promete alterar o decreto recém-publicado que regulamentou a Lei de Crimes Ambientais.

Há 15 dias, manifestei meu estranhamento com declarações do ministro Mangabeira Unger, de que a legislação ambiental brasileira não fora construída "para valer". Estava em dúvida se o ministro expressava alguma nova visão do governo federal sobre política ambiental. Os sinais aqui relatados reduzem o espaço da dúvida.

Para a sociedade brasileira, que avalizou as corajosas medidas de combate ao desmatamento e recebeu de forma entusiasmada a declaração do presidente de que não haveria retrocesso na política ambiental, será difícil aceitar mudanças na contramão do que foi dito há apenas três meses. Caso o compromisso assumido pelo presidente simplesmente tenha sido sido ignorado pelos ministérios que deveriam zelar por ele, resta a esperança de urgente correção de rumos.
(Fonte: Folha de São Paulo - SP)

De caminhonete, com um índio, percorrendo a Raposa/Serra do Sol: sinais de provocação e conflito

26/08/2008 - 11h52

Carolina Juliano
Enviada especial do UOL
No Distrito de Surumu (Roraima)

Tive sorte ao pegar no telefone em Boa Vista, capital de Roraima, e tentar contatar Dionito José de Souza, o líder indígena que está mais por dentro da situação da homologação da Raposa/Serra do Sol. "Dionito, estou pensando em ir para Pacaraima para acompanhar mais de perto as coisas uma vez que lá é mais próximo da entrada da reserva, vocês têm alguém lá que eu possa fazer contato?", perguntei. "Estou indo agora para aquela região, vou para a reserva." Depois de uma pequena insistência da minha parte, ele concordou em me levar de carona. Só pediu que eu contribuísse com alguma quantia para pagar o combustível porque para me deixar depois em Pacaraima teriam que desviar o caminho e percorrer mais 60 quilômetros. Aceitei sem pensar.


A Mitsubishi cabine dupla que nos levaria é do cunhado de Dionito. A caminhonete do Conselho Indígena de Roraima (CIR) estava quebrada, sendo arrumada em um mecânico. A minha mala foi colocada na caçamba, junto com sacos de mantimentos que seriam levados para a sede do CIR em Surumu. E foi tudo empacotado com um plástico preto para proteger da chuva que cai insistentemente na região nesse final de inverno.

A caçamba levava ainda um galão grande com óleo diesel. Não há postos de abastecimento para aqueles lados e para percorrer grandes distâncias é preciso levar na mala combustível extra.

Partimos pela BR-174. A Mitsubishi levava ainda, além de Dionito e do motorista, o biólogo André, paranaense de Curitiba, que há quatro anos trabalha em um projeto de educação ambiental da prefeitura de Boa Vista; e o índio macuxi Sobral, que também é de uma comunidade que está dentro da reserva Raposa/Serra do Sol, mas há oito anos trabalha com educação indígena junto ao governo.

Além de saber como as coisas andam em Surumu, principal porta de entrada para a reserva Raposa/Serra do Sol, o que os levava lá hoje era uma reunião na escola de formação profissional que lá existe. Dionito está tranqüilo quanto ao julgamento da próxima quarta-feira, em Brasília.

Tento puxar conversa sobre o assunto, saber o que será feito no dia e ele limita-se a dizer: "Nada, vamos aguardar. Quem vai julgar é o STF, a nós só nos resta esperar". Mas depois ele admite que tem gente do CIR em Brasília, acompanhando tudo de perto.

A BR-174 vem de Manaus e chega até a Venezuela, na fronteira de Pacaraima. É bem asfaltada e corta um cerrado vazio, paisagem que só se modifica quando alguma ação do homem interfere. "Essa área toda de árvores é de um suíço", conta o biólogo. "Ele veio para cá plantar acácias para fazer papel. Mas o solo aqui não é bom para isso porque só tem água em grande profundidade. As acácias não crescem."

Segundo ele, o investimento para se irrigar uma plantação dessas não vale a pena e o suíço agora pretende vender as terras, com as acácias todas dentro, para outro grupo europeu que também não deve fazer nada com aquilo. "Isso só pode ser lavagem de dinheiro", comenta.

Depois de meia hora de viagem, uma parada para "merendar qualquer coisa", anuncia Dionito. Dali a Surumu ainda haveria mais uma hora de viagem. Em um quiosque na beira da estrada, eles comem coxinha com guaraná antártica e eu tento sinal no celular. "Esquece", diz líder indígena. "Aqui não tem sinal de nada. Mais para frente pegamos sinal da Vivo, mas é só."

Após 170 km percorridos na BR-174, pegamos uma vicinal à esquerda. A placa indica 30km para o Distrito de Surumu. Ali acabou o asfalto. Aliás, segundo meus companheiros de viagem, além da 174 há apenas mais uma rodovia estadual que é asfaltada, as demais são todas de terra.

O líder indígena Dionito de Souza

Quase só caminhonetes são vistas transitando na região. Vez ou outra se avista um carro pequeno de algum taxista acostumado a percorrer a região para levar pesquisadores e até mesmo jornalistas à entrada da Raposa/Serra do Sol. No geral, o chão de terra é bom, mas em alguns trechos é difícil imaginar como qualquer carro que não seja 4x4 atravessa.

Além das picapes das lideranças indígenas, do Ibama e dos policiais da Força Nacional, que estão na região desde os conflitos de abril deste ano, pela mesma estrada passam também com freqüência Paulo César Quartiero, o prefeito de Pacaraima e líder dos arrozeiros, e seus funcionários. A estrada dá acesso a uma de suas fazendas de produção de arroz.

"Essa é a ponte que foi queimada pelos arrozeiros", mostra Dionito. "Imagine o transtorno que nos causou. Nessa época de cheia, não temos desvio para chegar a Surumu. Ficamos isolados, sem mantimentos e sem remédios." A ponte de madeira já está de pé de novo. Foi reconstruída pelo governo do Estado de Roraima.

Cerca de 20 minutos depois de sacolejar pela vicinal de terra, avistamos uma enorme bandeira do Brasil sobre outra ponte e os primeiros sinais de zona habitada. Estamos às portas da área delimitada e homologada pelo governo como Terra Indígena Raposa Serra do Sol.

Nenhuma placa indica que ali é reserva, mas a casas de cimento (da Prefeitura de Pacaraima) e de sapé, dos índios da região, deixam clara a divisão de interesses no local. Além disso, há pelo menos quatro meses a presença contínua de agentes da Polícia Federal no local também dispensa qualquer aviso de placa.

No meio dos quiosques de sapé, uma casa branca destoa. "Prefeitura de Pacaraima", lê-se na placa. "Pátria ou Morte. Venceremos" e "Não à Polícia Federal. Sim ao Exército Brasileiro", dizem duas faixas colocadas nas grades desta casa. "Tudo provocação do Paulo César", diz Dionito. "Ele como prefeito de Pacaraima construiu essa casa e mantém aí funcionários. Mas aqui já é terra indígena."

Estamos em Surumu. Logo na chegada, três picapes e meia dúzia de homens da polícia federal e da Força Nacional dividem uma sombra com dois ou três fiscais do Ibama. "Está vendo? Olha a confusão que estamos vivendo. É Ibama, polícia federal, força nacional, mídia, tudo atrapalhando o nosso dia-a-dia", desabafa Dionito. "E isso por quê? Porque não cumpriram a lei, que o próprio presidente da República decretou."

A Mitsubishi pára entre uma pequena igreja e uma maloca onde índias cortam carne de caça e logo desembarcam os mantimentos que foram trazidos por nós. Tudo é armazenado em um pequeno depósito, onde está também a farinha, o feijão e o beiju que eles mesmo produzem, além das bananas que plantam.

Ao descer, Dionito é recebido pelo seu povo com beijos e abraços. Logo lhe jogam nos braços a pequena Mônica, sua filha de menos de um ano de idade, que vive em Surumu. "Vamos merendar qualquer coisa e depois seguir para a escola de formação. Mas você pode ficar por aqui, se quiser, e conversar com o povo."

Eu aproveito, então, para conversar com aquela gente. Há ali índios de diversas comunidades, mobilizados pelo CIR à espera do julgamento desta quarta-feira. O macuxi Martinho ("não dou sobrenome porque não estou dando entrevista", avisa logo), me faz as honras da casa, mostra-me as instalações e dá conta das informações. Diz ele que há cerca de 400 índios vivendo em Surumu atualmente.

Eles não gostam muito de jornalistas. Dizem que nunca reportamos o que eles realmente dizem e que, geralmente, nos posicionamos contra os índios. Mas mesmo assim são amáveis e fazem questão de deixar claro que não querem nada, além do que é deles por direito.


Quase duas horas depois, Dionito volta e me chama para "ver uma coisa que ainda ninguém viu". Subo de novo na Mitsubishi e seguimos reserva a dentro por cerca de 7 km. Na margem esquerda da estrada, um grupo de 15 ou 20 indígenas ocupa a recém-criada Maloca dos Dez irmãos. "Ocupamos essa área no dia 5 de maio, depois que os homens do Paulo César balearam dez dos nossos irmãos", conta ele. Ali Dionito encontra a sua mulher, que permanecerá no local supervisionando o movimento até passar o julgamento.

"Agora já podemos ir embora", diz Dionito. Voltamos pela mesma estrada de terra até a BR-174. Onde a Mitsubishi deveria pegar a esquerda para voltar a Boa Vista, ela torna para o sentido contrário só para me levar a Pacaraima. "Eu prometi que e deixava lá, vamos em frente."

Dali a Pacaraima são mais 60 km e a estrada já não é tão boa. O asfalto esburacado obriga a reduzir a velocidade. Vinte minutos depois a paisagem muda. Estamos diante de uma serra e antes de começarmos a subi-la, Dionito pede para parar, o motorista retira da caçamba o galão de combustível.e guarda-o na casa de um conhecido à beira da estrada.

Logo adiante passaríamos pela fiscalização aduaneira brasileira. "Eles nos tomam o galão porque há muito problema de contrabando de combustível da Venezuela para cá", explica o líder indígena. "Deixamos aqui e pegamos na volta."

Mais 10 minutos e estamos em Pacaraima, que nada mais é do que um amontoado de pequenas casas em um povoado que cresceu na fronteira. A Mitsubishi pára diante da rodoviária, no Hotel Pacaraima. Cerca de 10 homens da Força Nacional dividem um banco em frente ao hotel "É contra minha vontade que você fica aqui", diz Dionito. "Em Pacaraima não há condições para você trabalhar e eu nem sabia que havia esse hotel."

Atencioso, o coordenador do Conselho Indígena de Roraima me fornece os seus telefones e me diz para ligar se tiver qualquer problema. Dou a ele R$ 50, a minha colaboração para o combustível, que havia prometido. Ele aceita meio sem jeito, dá meia volta e entra na pick-up. "Qualquer problema me procure, não se esqueça". Palavra de índio.

Brasília ameaçada - artigo deOscar Niemeyer

Por Oscar Niemeyer*

Minha idéia era voltar um pouco ao passado, lamentar que a proposta de uma cidade menor não tivesse sido adotada, e, para ser coerente, reclamar dos que pretendem aumentá-la ainda mais, multiplicando os problemas dessa cidade que, a meu ver, podia ser mais simples e melhor, como uma flor pousada naquela terra agreste e abandonada

Se a idéia inicial de JK tivesse sido seguida, Brasília seria menor com certeza. Lembro que Brasília surgiu como a nova capital que foi realizada naquele velho cerrado. Para lá seguiriam apenas os órgãos mais ligados à Presidência do país e os ministérios diretamente a ela vinculados. Seus moradores seriam, praticamente, funcionários do governo federal, e a cidade pensada em função deles, naturalmente, muitíssimo menor.

É claro que o número de visitantes continuaria enorme, obrigando a prever os hotéis, os restaurantes indispensáveis. E a nova capital seria, sem dúvida, mais acolhedora, mais humana — sua arquitetura apresentando a unidade plástica que numa cidade maior é difícil manter.

Se esse tivesse sido o programa confiado a Lucio Costa, Brasília continuaria a apresentar o aspecto monumental que ele tão bem soube conceber.

Mas a cidade está praticamente realizada, sua densidade demográfica superando os 500 mil habitantes previstos no Plano Piloto. Ameaçada por todos os problemas que uma metrópole em expansão tem de enfrentar. Daí eu concordar com o meu amigo Carlos Magalhães, que, interessado, como sempre foi, nos problemas da nova capital, se levanta mais uma vez contra essa idéia absurda de criar novas áreas urbanas.

Não sei se este texto se faz indispensável. Afinal, o governador José Roberto Arruda, competente como é, saberá encontrar uma solução para essa questão, que, acredito, é fundamental para o futuro de Brasília.

Releio este artigo. Minha idéia era voltar um pouco ao passado, lamentar que a proposta de uma cidade menor não tivesse sido adotada, e, para ser coerente, reclamar dos que pretendem aumentá-la ainda mais, multiplicando os problemas dessa cidade que, a meu ver, podia ser mais simples e melhor, como uma flor pousada naquela terra agreste e abandonada.

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Oscar Niemeyer é arquiteto

terça-feira, 26 de agosto de 2008

Do decrescimento à desconstrução da economia - Parte II

5/08/2008 - 12h08


Por Enrique Leff*

México, 25 de agosto (Terramérica) - A transição da modernidade para a pós-modernidade significou passar da anticultura, inspirada na dialética, para o mundo “pós” (pós-estruturalismo, pós-capitalismo), que anunciava o advento de algo novo. Mas esse algo novo ainda não tem nome, porque sabemos nomear somente o que existe e não o que está por vir. A filosofia pós-moderna inaugurou a época “des”, aberta pelo chamado à desconstrução. A solução para o crescimento não é o decrescimento, mas a desconstrução da economia e a transição para uma nova racionalidade que construa a sustentabilidade.

Desconstruir a economia insustentável significa questionar o pensamento, a ciência, a tecnologia e as instituições que instauraram a jaula da racionalidade da modernidade. Não é possível manter uma economia em crescimento que se alimenta de uma natureza finita, sobretudo uma economia baseada no uso do petróleo e do carvão, transformados no metabolismo industrial do transporte e da economia familiar em dióxido de carbono, o principal gás causador do efeito estufa e do aquecimento do planeta que hoje ameaça a vida humana.

O problema da economia do petróleo não é apenas, nem fundamentalmente, o de sua gestão como bem público ou privado. Não é o do aumento da oferta, da exploração de reservas e das jazidas dos fundos marinhos para baratear novamente o preço da gasolina, que passou dos US$ 4 o galão. O fim da era do petróleo não resulta de sua escassez crescente, mas de sua abundância em relação à capacidade de absorção e diluição na natureza, do limite de sua transmutação e disposição para a atmosfera em forma de dióxido de carbono.

A busca do equilíbrio da economia por uma superprodução de hidrocarbonos para continuar alimentando a máquina industrial (e agrícola pela produção de biocombustíveis) coloca em risco a sustentabilidade da vida no planeta, e da própria economia. A “despetrolização” da economia é um imperativo diante dos riscos catastróficos da mudança climática, se for ultrapassado o limite das 450-550 partes por milhão de gases causadores do efeito estufa na atmosfera, como prevêem o Informe Sterne e o Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre a Mudança Climática. E isso apresenta um desafio às economias que dependem de seus recursos petroleiros (Brasil, México, Venezuela, em nossa América Latina), não apenas por seu consumo interno, mas por sua contribuição à mudança climática global.

A racionalidade econômica se implanta sobre a Terra e se alimenta de sua seiva. É o monstro que engole a natureza para expulsá-la por suas goelas, que exalam baforadas de fumaça na atmosfera, contaminando o meio ambiente e aquecendo o planeta. O decrescimento da economia não implica apenas a desconstrução teórica de seus modelos científicos, mas de sua institucionalização social e da subjetivação dos princípios que tentam legitimar a racionalidade econômica como a forma inelutável do mundo. Desconstruir a economia seria, assim, uma tarefa mais complexa do que desmantelar um arsenal bélico, derrubar o Muro de Berlim, demolir uma cidade ou refundar uma indústria.

Não é a obsolescência de uma máquina ou de um equipamento, nem a reciclagem de seus materiais para renovar o processo econômico. A destruição criativa do capital, que preconizava Joseph Schumpeter, não apontava para o decrescimento, mas para o mecanismo interno da economia que leva a “programar” a obsolescência e a destruição do capital fixo, para reestimular o crescimento insuflado pela inovação tecnológica como fole da reprodução ampliada do capital.

O crescimento econômico arrasta consigo o problema de sua medição. O emblemático produto interno bruto, com o qual se avalia o sucesso ou fracasso das economias nacionais, não mede suas externalidades negativas. Mas o problema fundamental não se resolve com uma escala múltipla e um método multicriterial de medida, como as “contas verdes”, o cálculo dos custos ocultos do crescimento, um “índice de desenvolvimento humano” ou um “indicador de progresso genuíno”.

Trata-se de desativar o dispositivo interno, o código genético da economia, e fazê-lo sem desencadear uma recessão de tal magnitude que termine acentuando a pobreza e a destruição da natureza. A descolonização do imaginário que sustenta a economia dominante não terá de surgir do consumo responsável ou de uma pedagogia das catástrofes socioambientais, como pode sugerir Serge Latouche ao pôr na mira a aposta pelo decrescimento.

A racionalidade econômica se institucionalizou e se incorporou à nossa forma de ser no mundo: o “homo economicus”. Trata-se, portanto, de uma mudança de pele, de transformar em vôo um míssil antes que exploda no corpo minado do mundo. A economia real não pode ser desconstruída mediante uma reação ideológica e um movimento social revolucionário. Não basta modelá-la incorporando outros valores e imperativos sociais para criar uma economia social e ecologicamente sustentável. É necessário forjar Outra economia, baseada nos potenciais da natureza e na criatividade das culturas, nos princípios e valores de uma racionalidade ambiental.

* O autor é ambientalista, escritor e ex-coordenador da Rede de Formação Ambiental para a América Latina e o Caribe do Pnuma. Direitos exclusivos Terramérica.

Decréscimo ou desconstrução da economia - Parte I

18/08/2008 - 11h08


Por Enrique Leff*

México, 18 de agosto (Terramérica) - Os anos 60 convulsionaram a idéia do progresso. Depois da explosão populacional, soou o alarme ecológico. Foram questionados os pilares ideológicos da civilização ocidental: a supremacia e o direito do homem de explorar a natureza e o mito do crescimento econômico ilimitado. Pela primeira vez, desde que o Ocidente abriu a história da modernidade, guiada pelos ideais da liberdade e do iluminismo da razão, questionou-se o princípio do progresso impulsionado pela potência da ciência e da tecnologia, que logo se converteram nas mais servis e servíveis ferramentas do acúmulo de capital.

A bioeconomia e a economia ecológica propuseram a relação entre o processo econômico e a degradação da natureza, o imperativo de internalizar os custos ecológicos e a necessidade de agregar contrapesos distributivos aos mecanismos do mercado. Em 1972, um estudo do Clube de Roma apontou, pela primeira vez, “Os limites do crescimento”. Dali surgiram as propostas do “crescimento zero” de uma “economia de estado estacionária”.

Quatro décadas depois, a destruição das florestas, a degradação ambiental e a poluição aumentaram de forma vertiginosa, gerando o aquecimento do planeta pelas emissões de gases causadores do efeito estufa e pelas inelutáveis leis da termodinâmica, que desencadearam a morte entrópica do planeta. Os antídotos produzidos pelo pensamento crítico e a inventiva tecnológica resultaram ser pouco digeríveis pelo sistema econômico. O desenvolvimento sustentável se mostra pouco duradouro, porque não é ecologicamente sustentável!

Hoje, diante do fracasso dos esforços para deter o aquecimento global (o Protocolo de Kyoto havia estabelecido a necessidade de reduzir gases causadores do efeito estufa ao nível de 1990), surge novamente a consciência dos limites do crescimento e a chamada ao decrescimento. Embora Lewis Mumford, Ivan Illich e Ernst Schumacher voltem a ser evocados por sua crítica à tecnologia e seu elogio “do pequeno”, o decrescimento se apresenta diante do fracasso do propósito de desmaterializar a produção, o projeto impulsionado pelo Instituto Wuppertal que pretendia reduzir em quatro, e até dez vezes, os insumos da natureza por unidade de produto.

Ressurge, assim, o fato indiscutível de que o processo econômico globalizado é insustentável. A ecoeficiência não resolve o problema de um mundo de recursos finitos em perpétuo crescimento, porque a degradação entrópica é irreversível. A aposta pelo decrescimento não é apenas uma moral crítica e reativa, uma resistência a um poder opressivo, destrutivo, desigual e injusto; não é uma manifestação de crenças, gostos e estilos alternativos de vida; não é um simples decrescimento, mas uma tomada de consciência sobre um processo que se instaurou no coração do mundo moderno, que atenta contra a vida do planeta e a qualidade da vida humana.

O chamado para decrescer não deve ser um simples recurso retórico para dar vôo à critica do modelo econômico imperante. Deter o crescimento dos países mais opulentos, mas continuar estimulando o dos mais pobres ou menos “desenvolvidos” é uma saída falsa. Os gigantes da Ásia despertaram para a modernidade; apenas China e Índia estão alcançando e ultrapassando as emissões de gases causadores do efeito estufa produzidas pelos Estados Unidos. A eles se somariam os efeitos conjugados dos países de menor grau de desenvolvimento levados pela racionalidade econômica hegemônica.

Decrescer não implica apenas em desacelerar ou se desvincular da economia. Não equivale a desmaterializar a produção, porque isso não evitaria que a economia em crescimento continuasse consumindo e transformando natureza até ultrapassar os limites de sustentabilidade. A abstinência e a frugalidade de alguns consumidores responsáveis não desativam a mania de crescimento instaurada na raiz e na alma da racionalidade econômica, que contém um impulso ao acúmulo do capital, às economias de escala, à aglomeração urbana, à globalização do mercado e à concentração da riqueza.

Saltar do trem andando não conduz diretamente a desandar o caminho. Para decrescer não basta baixar da roda da fortuna da economia. As excrescência do crescimento, o pus que brota da pele gangrenada da Terra, ao ser drenada a seiva da vida pela esclerose do conhecimento e a reclusão do pensamento, não se retroalimenta no corpo enfermo do planeta. Não se trata de reabsorver seus dejetos, mas de extirpar o tumor maligno. A cirrose que corrói a economia não será curada com a injeção de mais álcool na máquina de combustão dos carros, das indústrias e dos lares. Além da rejeição à mercantilização da natureza, é preciso desconstruir a economia realmente existente e construir outra economia, baseada em uma racionalidade ambiental.

* O autor é ambientalista, escritor e ex-coordenador da Rede de Formação Ambiental para a América Latina e o Caribe do Pnuma. Direitos exclusivos do Terramérica.

Regulamentação do Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal

O Serviço Florestal Brasileiro vai ouvir a população sobre a minuta de decreto que vai regulamentar o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal (FNDF). As sugestões e contribuições para o aprimoramento do documento podem ser enviadas para o email fomento@florestal.gov.br até o dia 19 de setembro de 2008.

Por meio da consulta, a população poderá opinar sobre as diretrizes que vão regulamentar o FNDF, como a forma de aplicação dos recursos, mecanismos de planejamento anual dos investimentos e de avaliação dos resultados obtidos e também sobre participação da sociedade em sua gestão.

As sugestões recebidas serão sistematizadas e levadas à Comissão de Gestão de Florestas Públicas (CGFLOP) para aprimoramento na próxima reunião técnica com o Serviço Florestal, nos dias 23 e 24 de setembro. A consulta pública é um mecanismo de participação e transparência para que a população possa se manifestar sobre a regulamentação do FNDF.

FNDF - O Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal foi criado por meio da Lei de Gestão de Florestas Públicas (11.284/2006) e tem por finalidade fomentar o desenvolvimento das atividades sustentáveis de base florestal no Brasil e promover a inovação tecnológica no setor.

As principais fontes de recursos do FNDF envolverão a parte dos recursos arrecadados a partir dos contratos de Concessões Florestais em florestas públicas da União, doações realizadas por entidades nacionais ou internacionais, públicas ou privadas, reversão dos saldos anuais não aplicados e outras fontes de recursos que lhe forem especificamente destinados, incluindo orçamentos compartilhados com outros entes da Federação.

A estimativa é que o FNDF arrecade anualmente cerca de R$ 10 milhões com recursos oriundos das concessões nas florestas públicas da União, que têm previsão para quatro milhões de hectares concedidos até o ano de 2009.

As áreas prioritárias para a aplicação de recursos do FNDF envolvem pesquisa e desenvolvimento tecnológico em manejo florestal, assistência técnica e extensão florestal, recuperação de áreas degradadas com espécies nativas, aproveitamento econômico racional e sustentável dos recursos florestais, controle e monitoramento das atividades florestais e desmatamentos, capacitação em manejo florestal e formação de agentes multiplicadores e atividades florestais, educação ambiental e também proteção do meio ambiente e conservação dos recursos naturais. (Fonte: SFB)

Minc cava seu primeiro milhão

O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, acaba de completar 100 dias no cargo, como o autor das multas mais rápidas e caras da história do Ibama. Bem espalhafatoso, como só ele sabe ser. O novo ministro conseguiu em três meses o que sua antecessora Marina Silva levou um semestre para fazer.

Na sua gestão, o Ibama aplicou mais de R$ 1 bilhão em multas ambientais. No ano, já são R$ 2,2 bilhões, com valor médio de R$ 172,4 mil, o dobro do cobrado em 2007, quando o órgão puniu os infratores em R$ 2,3 bilhões. Ocorre que números sozinhos, ditos ao acaso, mentem. Não é que a gestão esteja mais competente, mas foram as canetas dos fiscais que ficaram mais carregadas. Na verdade, é a caneta do próprio ministro que parece descontrolada.

Ele fez sua estréia como fiscal ambiental, no final de julho, seguido por um séquito de agentes ambientais, polícias federal e militar, lavrando quatro multas de R$ 10 milhões contra a Fazenda São Sebastião, no Pará. Uma semana depois, Minc condenou 24 usinas de açúcar de Pernambuco a pagar R$ 120 milhões. Isso tudo, apesar de ele mesmo reconhecer que, nos dois últimos anos, menos de 10% das penas chegaram aos cofres públicos. Minc também é eloqüente ao falar sobre o assunto: "Hoje mais de 90% das multas não são pagas. Isso desmoraliza os órgãos ambientais".

Os usineiros de Pernambuco entraram com recurso administrativo para rever a pena. O Ibama, por sua vez, pediu e a Justiça negou a exigência de que os usineiros fossem obrigados a tirar licenças agrícolas - eles têm a agroindustrial. "Essas multas do Ibama foram feitas em série, sem o cuidado de fiscalizar, voltadas exclusivamente para a mídia", acusa Renato Cunha, representante dos usineiros pernambucanos. "Não vamos pagar a multa e vamos pedir danos morais pelo uso da imagem."

Apesar de estar consciente de todos os problemas, nos últimos três meses Minc copiou a Polícia Federal no estardalhaço. Numa operação chamada de Guardiões da Amazônia, os agentes ambientais aplicaram R$ 40 milhões em multas no município de Altamira, no Pará. Um fazendeiro de Alto da Boa Vista, no Mato Grosso, foi multado em mais de R$ 20 milhões, por desmatar quatro mil hectares numa área indígena. Em outra operação, a São Francisco, em Rondônia, foram lavrados 81 autos de infração e R$ 11 milhões de multas.

A lista é grande e pega desde o desconhecido produtor de arroz Paulo César Quartiero, condenado a pagar R$ 30,6 milhões, até o homem mais rico do Brasil, Eike Batista, multado em R$ 25 milhões porque o Ibama de Mato Grosso do Sul concluiu que 90% dos fornecedores de carvão vegetal da siderúrgica de Eike operam na ilegalidade. "Não nos interessa a floresta no chão, porque o manejo florestal sustentável pereniza a floresta", diz o madeireiro Luiz Carlos Tremonte, presidente do Sindicato das Indústrias Madeireiras do Pará. "A multa não é a solução, porque o problema é o nosso Código Florestal, que empurra o produtor para a ilegalidade."

O ministro tem discutido alterações no Código Florestal. Mas, no momento, ele só conseguiu que o presidente Lula editasse um decreto regulamentando a Lei de Crimes Ambientais. A nova legislação estabelece que as multas ambientais podem chegar a R$ 50 milhões e acelera a decisão administrativa. "Deve cair de quatro anos para quatro meses", avisa Minc.

Só há uma questão. O ministério consegue agilizar o processo administrativo, mas não tem como acelerar na Justiça. "O decreto não facilita a cobrança, porque ninguém saca milhões do bolso e paga. Os valores são irreais e em 99% dos casos vão parar na Justiça, onde o governo perde", diz o advogado Renato Ayres, sócio do escritório C. Martins & Advogados Associados. "Na Justiça, a média é de 5 a 8 anos, mas há casos que levam meio século. Nesse ínterim, os devastadores já extraíram proveito, fecharam a porta e foram embora." (Fonte: Isto é Dinheiro)


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sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Considerações sobre educação ambiental, CBHs - caso Lagoa IBIRITÉ - MG

Um aspecto que merece nossa atenção é a necessidade de reforçarmos a visão e afirmação e conceitualização da POLITICA NACIONAL DE RECURSOS Hídricos como Política
PUBLICA. Tal entendimento foi corrompido por uma falsa idéia de sistema, que na verdade encobriu uma estratificação perniciosa obscurecedora de práticas corporativas e interesses setoriais. Construíram conceitos congenitamente equivocados que a faz com que em muitas situações, a Política de Recursos hídricos seja na verdade, espaços de legitimação da “comodditty” água no decorrer dos tempos. Os interesses que impedem dela ser administrada como bem publico e essa maneira sorrateira de impedir a consciência social sobre ela, bem que poderia possibilitar uma melhor distribuição de renda a partir da situação onde a sociedade receba pela água que disponibiliza para o desenvolvimento econômico e acumulação de poucos. Isto sugere a todos nós, esforço para que água possibilite que o desenvolvimento econômico esteja pari-passo com o desenvolvimento social sob pena de transformarmos às instâncias de gestão futuramente,em bolsa de negociação dos direitos de uso da água. Uma paisagem que não combina é tanta miséria as margens dos rios.
Aliás, já apareceu um cidadão na CTCOB do CNRH, sugerindo algo que parecido com um adiantamento para os Comitês de Bacias pelo uso econômico da água pelos usuários, onde se teria a CAIXA como operadora dessa negociação ou adiantamento. Se tivermos de implantar esse instrumento DE COBRANÇA através desse ARTIFÍCIO estaremos condenando nossa historia e esforço e nossa luta como infrutífera. A sociedade através do instrumento econômico da cobrança da lei 9433 deve ser ressarcida pela isponibilidade de seus recursos naturais e com melhor qualidade de vida a partir da situação ambiental de seus rios lagos e corpos d’água quando utilizados e aproveitados para atividades econômicas diversas e quando as condições ambientais estiverem
satisfeitas para tal. É justo que a comunidade que disponibiliza seus recursos aufira o resultado dessa riqueza. Por essa ótica o instrumento da COBRANÇA pode ser
também um grande fator de indução ao desenvolvimento sociale da qualidade de vida das populações não somente em função do rio que ela disponibiliza mas também em função de outras externalidades que possam representar impactos positivos na vida das pessoas.(Um exemplo disso é o caso de uma cidade que existe no Paraná que recebe royaltyes pelo uso da água de modo que a cidade, pela relação per capita, aufere uma receita e pode fazer grandes investimentos sociais na qualidade de vida e da
saúde da população). O reducionismo que afirma que é o setor econômico que financia o sistema é uma falácia que precisa ser entendida por esses pressupostos.
Um exemplo que eu entendo como otimização do bem público - Lagoa da Petrobras em Ibirite – MG e que sugere possibilidades de se aproveitar as instâncias de gestão
tipos CBHs para fazer com que os grupos sociais ou grupos de pessoas e cidadãos pensando, planejando e participando nas instâncias competentes para afirmar o que fazer com os recursos oriundos do uso econômico de seus recursos naturais. Nesse aspecto, urge estar todos os envolvidos deveras sintonizados para não haver confusão entre mobilização, participação, e articulação e sim construir convergências para se construir uma agenda local.
O problema é que nesse processo hegemônico da tecnocracia hídrica hidrológica, o medo e timidez dos grupos sociais da região aparecem nítidos pela vantagem que tem os “técnicos” de levar as coisas do jeito “você sabe com quem está falando”? E provocam um retrocesso no ímpeto de participar.
No reinado de Tanatos vive a tecnocracia que tem medo da participação e inserção social na gestão das águas. A fácil dicotomia ainda não explica o tão complexo é essa situação.

As populações nunca operarão no sistema de gestão das águas com a mesma visão do técnico e isso ele (o técnico) não vai conseguir falar em nome do povo, mesmo que contratem os melhores cientistas sociais do mundo (será que agora eles entendem que esse pessoal pode servir?). O certo é o seguinte. Se essa política publica não mostrar nada de resultado para o povo...ele vai gradualmente se organizar para esvaziar ela, e atazanar pessoas ou técnicos sérios que lutam o tempo todo para essa política ser eficiente . O tempo vai dizer qual vantagem e resultado podem ter a
Petrobras e a população local do lago e da bacia se não houver uma equação que possibilite um desenvolvimento sócio ambiental integrado das populações do entorno do
empreendimento Lago. Acho que a ideologia patrimonialista e corporativa conseguiram frustrar o povo na política de saúde com o tal “controle social” do SUS mas não com a água.

Isto posto, a Petrobras como qualquer outro usuário das águas públicas, não está numa compra de água em Ibirité.
Apesar desse ser o raciocínio ‘fácil. Os recursos oriundos da compensação pelo uso da água não é um favor da sociedade,não é uma simples troca de compensações, tampouco uma simples operação de disponibilização de recursos para compra de cartilhas ou fazer alegorias passageiras. Os problemas técnicos operacionais da Petrobras nesse lago e a pressão social continuarão e nesse sentido a integração de instrumentos da POLÍTICA DE GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS ATRAVÉS DO CBH integrando-se com outras políticas são fundamentais.A EDUCAÇÃO E MOBILIZAÇÃO SOCIAL nesse aspecto têm muito a contribuir...e o mais importante, pactuar entre todos uma tecnologia de gestão. Hoje, na região temos problemas de acesso à saúde, acesso a educação, pressão por
escolas, qualidade de vida, transporte tudo isso junto com tudo, gerando sujeira e poluição para o lago. Nesse sentido como vamos pensar e executar uma EDUCAÇÃO AMBIENTAL no âmbito de uma política de recursos hídricos?Como pode uma população tão pobre junto de um empreendimento tão rico Nesse contexto os projetos e compensações de grande monta numa região delimitada e impactada por um grande empreendimento podem ser entendidos não somente como um produto de prateleira, mas como algo mensurado pela mudança de qualidade de vida. Imaginemos se toda renda do petróleo derivado das novas descobertas do Pré-sal fossem totalmente direcionados para fazer uma grande revolução na educação desse país. Que revolução? Imaginemos, porém, a tamanha
dificuldade da tecnocracia entender assim. Isso é que é indicador de subdesenvolvimento. Os setores e corporações abocanharam o estado tem mais medo disso do que a burguesia industrial do começo do século tinha da classe operária.
Cobram da sociedade uma comissão enorme. Desnudar e possibilitar o entendimento disso é o papel da educação ambiental e mobilização .Educação ambiental serve também pra
superar isso.
O desenvolvimento de programas de educação ambiental no CBH não pode ser visto de uma maneira mecânica como se fosse à relação entre “qual a importância do técnico e das
tecnologias e nomenclaturas da gestão das águas sobre a população”. É necessário traduzir-se o desejo das pessoas e visibilizá-lo nas metodologias para a população, que se afoga, e que se contamina.
Um PROGRAMA DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL A MEU ver, deve primeiramente refletir e indicar o estado da arte do que pensam todos os atores envolvidos, pois disso resulta o
fortalecimento institucional do CBH e do modelo que tanto lutamos e, sobretudo um novo olhar da Petrobras sobre o LAGO, bem publico de valor que extrapola nossa tradicional noção de valor. Dessa forma, o processo de comunicação, educação e mobilização, deve resgatar esses pontos não somente nas cartilhas ou nas alegorias culturais ali previstas mais uma equação inteligente para conseguirmos esses resgates nas atividades previstas.
“E preciso superar visão ‘FUNCIONALISTA” DE educação e mobilização e cito comumente três fundamentos que adoto nos processos de capacitação e mobilização para possibilitar as pessoas e cidadãos cuidar de seus corpos d'água que devem estar intrinsecamente relacionados, que são:
1 - As ações devem propiciar a agregação de pessoas CIDADÃS à gestão e as preocupações preservacionistas sobre biodiversidade da região. A gestão pressupõe o surgimento de um capital intelectual e político que deve ser administrado
doravante. Pois seja lá o que se fizer com nome de educação ambiental vai ser julgado e potencializado por todos os atores como variável importante da relação dos
empreendedores de uma Bacia Hidrográfica com a população local.
2 – Devem-se trabalhar novos valores e sabê-los passar aos cidadãos nessas metodologias a serem desenvolvidas e esses valores passam por temas bastante atuais e relacionados à vida das pessoas que é a construção de uma nova ética a partir do que a própria natureza nos ensina. A água não suporta traição, a água não suporta subterfúgio, a água boa foge de quem não cuida dela, á água desnuda a má fé e a má
política. A água e segurança estão juntas ..a segurança da Petrobras, A seguranças da população..temas correntes e imprescindíveis não coexistem separadamente. (O dialógico)
3 - Não existe possibilidade de se fazer gestão de um bem publico sem que os atores sociais institucionais, sobretudo,os CBH e as populações nele representadas não construam e reelaborem sua experiência e vivencia com seu rio relacionando dentro da ESTRUTURA ONDE SE ENCONTRAM, O ESTADO e a cidadania, O PUBLICO E O PRIVADO. O que é isso?
Fazer educação ambiental escamoteando esses aspectos é mesmo que estarmos armando bombinhas para nossas posteridades.
Temos que desenvolver metodologias que contemple a perspectiva dialógica, estruturante e sistêmica. Dimensões essas que devem ser consideradas nos produtos e metodologias a serem desenvolvidas nos projetos que normalmente são financiados por condensações ambientais quase sempre e propositadamente vistos como muito menos do que uma poesia de Drumond. “Apenas um volume na estante” Com a água não existe processo educativo eficaz e eficiente mobilizativo que não termine em um pacto entre AQUELE QUE TEM poder dentro das estruturas institucionais e o povo que merece ser
ressarcido de seu patrimônio natural.
É necessário, portanto nivelarmos nossas convergências conceituais, nossos medos e desejos. Só quem está de ma fé tem medo de Eros e da educação ambiental no estado
democrático e de direito. Afora disso, fica difícil até para se trabalhar errado, pois tudo isso é de uma DELICADEZA que suponho poucos atores das profissões de bases tecnológicas conseguem captar. E a sociedade já há dez anos está pagando um preço caro por causa dessa imaginação sociológica distorcida desses grupos filhos de Tanatos que instituíram a POLITICA NACIONAL DE RECURSOS HIDRICOS e que não deixam os
grupos sociais a instituírem a partir de suas vivencias.Nos dez anos da política nacional de recursos hídricos não podemos correr o risco de continuarmos participando de uma enganação do povo mais uma vez com DESEDUCAÇÃO POLITICA PROMOVENDO ALEGORIAS AMBIENTAIS.

O cenário que detectei em uma visita a uma equipe multidisciplinar levou-me a colocar para eles minhas impressões sobre as possibilidades e limites de aplicarem-se
esses pressupostos...:
1 - A EQUIPE DEVE FAZER VIGOROSO ESFORÇO INTELECTUAL DE FORMAÇÃO PERMANENTE EM CIMA DO PROJETO, DA REALIDADE LOCAL PAUTANDO POR UMA CONVIVÊNCIA ÉTICA SAUDÁVEL ENTRE ELAS, DE RESULTADOS PARA TODOS. Cuidado com DARWINISMO BUROCRÁTICO DE GÊNERO.

2 – Estabeleçam uma agenda de relacionamento e convivência e interação com a agenda dos públicos alvos previstos. da população do entorno nem que seja para estabelecer amizades, se já não tiverem uma visibilidade técnica do projeto. As meninas devem estabelecer uma agenda mínima com esse povo que estão nos projetos.

3 – A equipe deve se inteirar de tudo que acontece no CBH, sua dinâmica, o que
significa, suas estratégias, seus atores, devem entender os instrumentos e fundamentos da Política de Recurso Hídricos. Nivelar essa situação. Sugeri uns textos sobre isso. O que , pra que , estamos aqui, aonde queremos chegar? O plano de Bacias, etc.
4 – Pautei minha discussão para construção de uma visão sistêmica de quem exerce a atividade de educação ambiental O que isso, o que é dialógica, o significado do conflito, a administração do conflito na Bacia.
5 – Como o CBH tem condições de administrar o capital intelectual e político decorrente da mobilização?


João Climaco
Tecnologias Sociais e Ambientais para participação social em
um corpo dagua impactado por grande empreendimento

Alimentação: O alimento são continuará sendo são?

22/08/2008 - 05h08

Por Thalif Deen, da IPS

Estocolomo, 21/08/2008 – Vegetais, arroz e outros cereais em pelo menos 53 cidades da América Latina, África e Ásia poderão ser comercializados algum dia com um rótulo alertando: "Isto é um subproduto de esgoto". Tendo por pano de fundo o aumento nos preços dos alimentos e a escassez mundial de água potável, os agricultores de hortas urbanas são forçados a usar água de esgoto não tratado ou de rios contaminados para manterem sua atividade e sobreviverem economicamente. Uma análise de 53 cidades revela que se trata de uma prática com um nas nações mais pobres do mundo, onde o uso de água de esgoto é vital para a renda dos agricultores e para a segurança alimentar, embora ao mesmo tempo apresente riscos críticos para a saúde.

O estudo, realizado pelo Instituto Internacional de Manejo da Água (WMI), diz que em cerca de 80% das cidades analisadas utiliza-se água parcialmente ou não tratada na agricultura. A pesquisa foi divulgada em coincidência com a Semana Mundial da Água, que acontece esta semana em Estocolmo. Em 70% das cidades estudadas, mais da metade das hortas são irrigadas com água de esgoto não tratada ou diluídas em riachos.

Seu uso é um fenômeno generalizado, em uma área de aproximadamente 20 milhões de hectares no mundo em desenvolvimento, diz o estudo.
Normalmente inclui efluentes industriais e resíduos, alem de dejetos de cozinhas e banheiros. Isto acontece principalmente em países asiáticos, como China, Índia e Vietnã, mas também é comum em quase todas as cidades da África subsaariana e várias latino-americanas, como São Paulo, Bogotá, La Paz, Lima e Santiago do Chile.

O estudo indica que as águas residuais são em grande parte usadas para produzir vegetais e cereais, sobretudo arroz, o que representa preocupações sobre os riscos para a saúde das pessoas, principalmente se forem consumidos sem passarem por um cozimento. Mas, ao mesmo tempo, estas águas contribuem de forma importante para a oferta de alimentos e significam um meio de vida para os pobres urbanos, especialmente mulheres e migrantes recentes chegados do interior dos países.

O informe dá como exemplo a cidade de Accra, capital de Gana, que tem população de aproximadamente dois milhões de pessoas. Estima-se que 200 mil delas compram diariamente vegetais produzidos em apenas 100 hectares regados com água de esgoto. Consumidores das 53 cidades analisadas dizem que preferem não comprá-los, mas que não têm como saber a origem dos produtos que estão levando para casa. Os agricultores estão conscientes de que essa fonte de irrigação é perigosa para a saúde dos consumidores e deles mesmos, mas, têm poucas opções, já que a água subterrânea segura é uma alternativa pouco disponível, segundo o documento.

Os aspectos positivos e negativos desta prática só receberam atenção recentemente, disse Colin Chartres, diretor-geral do IWMI, que conta com o apoio do Grupo Consultivo Internacional sobre Pesquisa Agrícola (Cgiar). O estudo, acrescentou, oferece a primeira análise exaustiva, em vários países, sobre as condições existentes e as difíceis opções que surgem para balancear as vantagens e desvantagens.

Ao ser perguntado se os benefícios superam os riscos, Liqa Raschid-Sally, do IWMI-África Ocidental, disse à IPS que não existem estudos exaustivos sobre o assunto. "Mas, é totalmente claro que se pusermos fim a essa prática interromperemos a oferta de certos tipos de vegetais às cidades, que em 75% dos casos se abastecem de hortas urbanas ou suburbanas que utilizam águas residuais", acrescentou. A mais elementar das regras econômicas, a da oferta e procura, ensina que se isso for feito haverá aumento nos preços dos vegetais para os habitantes das cidades. Os riscos sanitários podem ser manejados, acrescentou.

Em Gana, Indonésia, Nepal e Vietnã, por exemplo, os agricultores armazenam água residual em tanques para permitir que o material sólido em suspensão seja eliminado. Inadvertidamente, isto possivelmente reduz a quantidade de bactérias na água. A mensagem para as nações mais pobres é que podem aplicar estes métodos para reduzir os riscos e apenas necessitam ser incorporados nos serviços de extensão agrícola, disse Raschid-Sally. "Não estamos incentivando o uso de água de esgoto, mas buscando melhorar essas práticas", ressaltou.

Pay Drechsel, do IWMI-Gana, afirmou que os benefícios e os riscos ocorrem em dois níveis: o dos agricultores e o da sociedade. Nos países pobres, onde os serviços sanitários não se expandam no ritmo da urbanização, os produtores às vezes não têm outra opção que não seja a de usar água contaminada. Proibi-lo por lei ameaçaria os meios de vida de milhares de famílias, com um impacto na pobreza muito maior do que a exposição a agentes patogênicos, que é manejável. Se há fontes alternativas de água segura disponíveis, combinadas com o transporte refrigerado de vegetais de folha, esta opção é decididamente preferível, dizem os especialistas. "Concordamos com a Organização Mundial da Saúde de que é preciso deter a irrigação com águas residuais", disse Drechsel à IPS.

Para manter o abastecimento de vegetais nas cidades, a OMS recomenda barreiras que dificilmente podem reduzir o nível de patogênicos nas colheitas. "Testamos e verificamos esse enfoque. Sua implementação, porém, requer mudanças de conduta e um mercado social da segurança alimentar, como o que vemos nas campanhas que promovem o ato de lavar as mãos", acrescentou Drechsel. Porém, a situação é diferente nas economias emergentes, onde a indústria química representa uma ameaça adicional, alertou.

Raschid-Sally afirmou que o uso de água de esgoto está relacionado em alguns casos com a crise de escassez mundial de água e, em outros, com a carência de fontes seguras alternativas "A descarga incontrolada de águas residuais está contaminando grandes volumes de água fresca", acrescentou. Segundo Dreschsel, "por um lado, onde as águas residuais são apenas tratadas parcialmente, ou não tratadas, são contaminantes e reduzem nossos recursos de água segura. Por outro lado, onde estamos em condições de utilizá-la estamos recuperando um recurso valioso".
(IPS/Envolverde)



(Envolverde/IPS)

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

COMO PRESERVAR UMA BACIA HIDROGRÁFICA DE ABASTECIMENTO PÚBLICO (II)

DESAFIOS À PRESERVAÇÃO DA ÁGUA PARA ABASTECIMENTO DA
POPULAÇÃO DE GOIÂNIA
Osmar Pires Martins Júnior*

A qualidade da bacia hidrográfica de abastecimento da população da metrópole goianiense não estará assegurada caso prevaleça uma visão exclusiva de comando-e-controle, pois se corre o risco de repetir o fenômeno que aconteceu na cidade de São Paulo entre a segunda metade da década de 1970 e de 1990. Esse exemplo histórico expôs as contradições sobre o uso e ocupação irregular do entorno das represas Billings e Guarapiranga, sobretudo na gestão municipal de Luiza Erundina (1989-92).

Os pesquisadores que discutiram o assunto na edição nº 23 da conceituada revista do Instituto Pólis, asseveram que, em meados da década de 1970, para a Grande São Paulo, prevaleceu a visão: "[...] de preservar ao máximo os recursos hídricos através de uma concepção de planejamento predominantemente tecnocrática, estabelecendo padrões de controle. Neste contexto, foi criada, em 1975, a Lei Estadual nº 898 de Proteção de Mananciais que representou, na época, medidas necessárias para estancar o processo de degradação das águas e representou um avanço no tratamento da questão, sendo efetivada por meio de rigorosa fiscalização [...]".

Mas, apesar do reconhecido avanço proporcionado pela legislação de proteção de mananciais, ela provocou um efeito oposto, conforme afirmação contida na citada revista: "[...] a desvalorização imobiliária gerada pela própria legislação provocou o rebaixamento do preço da terra. A região deixou de ser interessante para o mercado imobiliário devido às várias restrições para ocupação normatizadas pela lei, tornando-se um lócus do mercado ilegal de loteamentos clandestinos. Neste sentido, a aplicação da lei teve um efeito perverso [...]".

Os especialistas concluíram que terra barata aliada a grande demandade moradia da população pobre de São Paulo montou uma equação ideal para loteamentos clandestinos. Os governos locais, como instâncias mais próximas da população, sofrem as pressões cotidianas por melhorias e investimentos urbanos. Por isso, alertaram os especialistas, a política municipal para uma região de abastecimento público somente se torna viável quando integrada a políticas ambientais mais amplas, articuladas a esferas estaduais e federais de governo.

No caso em discussão, a necessária integração entre os níveis de governo não ocorreu. As contradições entre o Estado e o Município de São Paulo foram assim expostas: "[...] Como a Lei de Proteção de Mananciais está deslocada da lógica de ocupação da cidade, passou a contrariar a própria legislação municipal, que permite densidades mais altas de ocupação do que a lei estadual prevê. Para o parcelamento dos terrenos nas áreas rurais, as duas leis estabelecem cotas diferentes para o tamanho dos lotes. Através de decretos do executivo municipal, alguns lotes vêm sendo transformados em zonas urbanas, ainda que não possam ser regularizados. Mesmo assim, na falta de alternativas habitacionais, a população de baixa renda adquire os lotes [...]".

O resultado dos conflitos e contradições do caso histórico aqui exposto é conhecido por todos – aconteceu a favelização no entorno das represas Billings e Guarapiranga, sem nenhuma infra-estrutura de saneamento ambiental, de maneira que ocorreu o comprometimento da água de abastecimento público e a contaminação dos reservatórios responsáveis por 32% da água consumida na região metropolitana de São Paulo.

Com base na literatura especializada e nas experiências realizadas, é possível formular e executar políticas, planos, programas e projetos, baseados no ordenamento, zoneamento e gestão do território, de maneira a promover o manejo de bacias hidrográficas para o alcance de metas de proteção de mananciais de abastecimento público. A legislação e a regulamentação incidentes sobre o território-alvo do planejamento são os primeiros passos a serem seguidos por outros de igual importância para enfrentar o desafio da "crise da água" em nosso meio. No próximo artigo discorreremos a respeito.
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* Osmar Pires Martins Júnior é biólogo, engenheiro
agrônomo, mestre em ecologia, professor de cursos de graduação e
pós-graduação em IES, coordenou e integrou o estudo sobre o
diagnóstico ambiental e possibilidade de uso sustentável da bacia
hidrográfica João Leite, foi presidente da Agência Ambiental
de Goiás (2003-06), perito ambiental do MP-GO (1997-02),
secretário do Meio Ambiente de Goiânia (1993-96).

DESAFIOS À PRESERVAÇÃO DA ÁGUA PARA O ABASTECIMENTO PÚBLICO (I)

por Osmar Pires Martins Júnior*

A bacia hidrográfica João Leite – BHJL, localizada na
região central do Estado de Goiás, possui área de 765km².
Compreende parcelas dos territórios de sete municípios:
Anápolis, Campo Limpo de Goiás, Goianápolis, Goiânia,
Nerópolis, Ouro Verde de Goiás e Terezópolis de Goiás.
Dentro da bacia estão localizados mananciais de abastecimento
público de várias cidades, incluindo o reservatório João
Leite, em fase final de construção, que representa a principal fonte
de água para abastecer a região metropolitana de Goiânia.

Da área total da bacia, 709km² estão situados a montante ou
acima e 56km² a jusante ou abaixo, tendo como referência a cota
inferior do terreno enquadrado como Zona de Proteção do
Reservatório João Leite. O Decreto nº 5.704, de 27 de dezembro
de 2002 criou a Área de Proteção Ambiental - APA João Leite,
abrangendo toda a BHJL, sem, no entanto, delimitá-la. Posteriormente,
o Decreto nº 5.845, de 10 de outubro de 2003, localizou e delimitou a
área da APA, apresentando um memorial de caracterização. Este
memorial, entretanto, caracterizou apenas a área a montante da
barragem, deixando de fora a área a jusante.

Por esses decretos, a APA tem os objetivos de: proteger os recursos
hídricos da bacia do João Leite; assegurar condições para o uso
do solo compatível com a preservação dos recursos hídricos;
conciliar as atividades econômicas e a preservação ambiental;
proteger os remanescentes do bioma cerrado; melhorar a qualidade de vida
da população local por meio de orientação e do disciplinamento das
atividades econômicas; disciplinar o turismo ecológico e fomentar
a educação ambiental, dentre outros.

O Plano de Manejo da APA, em elaboração junto ao órgão gestor
da APA, a Secretaria do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos
–SEMARH, deverá ser implantado por portaria assinado pelo titular
da pasta, de acordo com o artigo 12, I, do Decreto nº 4.340, de 22 de
agosto de 2002, regulamentador da Lei nº 9.985, de 18 de julho de
2000 que dispõe sobre o Sistema Nacional de Unidades de
Conservação – SNUC.

A preservação da água de abastecimento de Goiânia se insere no
contexto de uma discussão pública sobre diferentes visões a
respeito do uso e ocupação do solo da bacia hidrográfica e do
entorno do reservatório João Leite. A elaboração de um
diagnóstico ambiental que fundamente concepções adequadas de uso
sustentável pode colaborar para desmistificar a visão de que o
poder público tem a competência exclusiva de preservar a bacia e a
qualidade da água do manancial de abastecimento.

O Estado, mesmo totalitário, não é onipresente. A política
de comando-e-controle não tem a capacidade de imprimir poder de
polícia suficiente para determinar o uso do solo numa bacia de
área gigantesca. Uma lei, decreto ou portaria que estabeleça o que
pode e o que não pode, abrangendo propriedades de domínio
público e, sobretudo, privado, será medida inócua se não
discutir a forma de uso e gestão, a ser compartilhada entre os
proprietários e os diferentes níveis de poder público.

Essa é a conclusão extraída do exemplo das represas
Guarapiranga e Billings, na região metropolitana de São Paulo. Os
esforços de fiscalização, com o uso de força policial,
helicópteros e delimitação de uma linha quilométrica de
proteção, emitindo-se milhares de notificações, multas, embargos e
até prisões de loteadores que desrespeitaram tal linha, não
impediram a favelização no entorno da represa. No próximo artigo
discorreremos sobre esse exemplo histórico, a partir do qual se pode
extrair lições a respeito da proteção de mananciais de
abastecimento público.

* Osmar Pires Martins Júnior é biólogo, engenheiro
agrônomo, mestre em ecologia, professor de cursos de graduação e
pós-graduação em IES, coordenou e integrou o estudo sobre o
diagnóstico ambiental e possibilidades de uso sustentável da bacia
hidrográfica João Leite, foi presidente da Agência Ambiental de
Goiás (2003-06), perito ambiental do MP-GO (1997-02), secretário
do Meio Ambiente de Goiânia (1993-96).

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

A 20 km de Brasília, Águas Claras, o maior canteiro de obras do País

OESP, 17 de agosto de 2008

A 20 km de Brasília, Águas Claras, o maior canteiro de obras do País

Em um ano, o m² passou de R$ 2,2 mil para R$ 3,8 mil, mas a infra-estrutura não avançou e o trânsito preocupa

Lisandra Paraguassú

Conhecida por ser hoje o maior canteiro de obras da construção civil do País, a cidade-satélite de Águas Claras, no Distrito Federal, chama a atenção pelo paredão de espigões de concreto armado, formando uma cortina de pedra que destoa dos riscos arquitetônicos "rasteiros" planejados para Brasília por Lúcio Costa e Oscar Niemeyer. Diante da demanda por moradia de classe média e da ausência de novos espaços para construir apartamentos no Plano Piloto, a cidade satélite acabou se transformando em palco do grande boom imobiliário candango. Parafraseando o poeta Fernando Pessoa, Águas Claras virou o tipo de cidade que "primeiro estranha-se, mas depois entranha-se".

Em um ano, o metro quadrado em construção passou de R$ 2,2 mil para R$ 3,8 mil, mesmo com enorme quantidade de apartamentos à venda, em torres que têm cerca de 20 andares. A aposta agora passou dos simples 2 e 3 quartos para 4 quartos e condomínios tão completos que parecem clubes. A explicação para esse boom vem do que acontece no Plano Piloto. Com apartamentos nas áreas mais nobres de Brasília - as Asas Sul e Norte e o setor Sudoeste - ultrapassando os R$ 5,5 mil o metro quadrado, Águas Claras terminou por se tornar a melhor opção para a classe média brasiliense.

E, como toda a cidade que cresce demais, Águas Claras enfrenta problemas típicos da urbanização. Até o ano passado, praticamente não havia sistema de esgoto. Algumas ruas, abertas para construção de mais prédios, ainda se mantêm sem asfalto. Não há escolas públicas nem postos de saúde.

Mas o que mais incomoda os moradores é o trânsito. A cidade fica a apenas 20 quilômetros do Plano Piloto, uma distância pequena para qualquer grande metrópole como São Paulo. No entanto, nos horários de pico, a viagem até o centro pode durar mais de uma hora. "O boom imobiliário acontece no País e o Distrito Federal não é diferente. Ao contrário, o poder aquisitivo aqui é alto, atraiu muitas empresas. A cidade cresce", diz Rejane Yung, subsecretária de Planejamento da Secretaria de Desenvolvimento Urbano. "O plano viário ainda não está instalado, mas temos de apostar também em um plano de transporte coletivo para convencer a classe média a deixar o carro em casa."

O administrador Ronaib Costa Ferreira, de 34 anos, morou a vida inteira na cidade-satélite do Gama, a 45 quilômetros do Plano Piloto. Em 2003, comprou o primeiro apartamento em Águas Claras. Virou síndico do condomínio, o Residencial Imprensa I, e adaptou-se tão bem que, há dois anos, deixou a empresa em que era representante comercial para virar síndico em tempo integral. "Estou tão adaptado que não gostaria de morar em outro lugar", comenta. "Aqui tem tudo perto. Meu filho estuda perto. Tem shopping, cinema, supermercado. Não preciso sair para encontrar nada."

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Estudo aponta aumento de zonas mortas nos mares

Quinta, 14 de agosto de 2008, 17h12

As zonas mortas nos oceanos do mundo, onde a ausência de oxigênio impede o desenvolvimento de vida marinha, aumentaram mais de um terço entre 1995 e 2007, afirma um estudo divulgado nesta quinta-feira pela revista Science.

» Colocar cal na água do mar reduziria CO2
» Mapa mostra marca do homem nos mares
» Presidente da CE quer combater destruição marinha

Os principais fatores dessa catástrofe oceânica são a contaminação por fertilizantes e a queima de combustíveis fósseis, segundo cientistas do instituto de Ciências Marinhas da Universidade William and Mary, na Virgínia, e da Universidade de Gotemburgo, na Suécia.

O aumento das zonas mortas no mar transformou-se no principal agente de pressão sobre os ecossistemas marítimos, no mesmo nível da pesca excessiva, perda de habitat e outros problemas ambientais.

Segundo os cientistas, seu aumento se deve também a certos nutrientes, especialmente o nitrogênio e o fósforo, que ao entrarem em excesso nas águas litorâneas causam a morte de algas.

Ao morrer, essas plantas microscópicas se afundam e se transformam em alimento de bactérias que, durante a decomposição, consomem o oxigênio a sua volta.

Na linguagem científica, esse processo da diminuição progressiva de oxigênio se chama 'hipoxia'.

Segundo Robert Diaz, professor do Instituto de Ciências Marinhas, e Rutger Rosenberg, cientista da Universidade de Gotemburgo, atualmente existem 405 zonas mortas em águas próximas às costas em todo o mundo, o que representa uma superfície de mais de 26.500 km².

Diaz, que começou a estudar as zonas mortas em meados da década de 1980, após advertir sobre o problema nas águas da Baía de Chesapeake (costa atlântica dos Estados Unidos), afirma que, em 1995, já havia 305 zonas mortas no mundo todo.

De acordo com o cientista, no início do século passado só havia quatro zonas mortas, número que passou para 49 em meados de década de 1960, 87 na de 1970 e para 162 na de 1980.

"Não existe outra variável de tanta importância para os ecossistemas marítimos litorâneos que tenha mudado tão drasticamente e em um lapso tão curto", afirmam Diaz e Rosenberg no estudo.

Segundo Diaz, as provas geológicas demonstram que as zonas mortas não eram 'um fenômeno natural' na Baía de Chesapeake e outros estuários.

"As zonas mortas eram raras. Agora são comuns. Cada vez há mais em mais lugares", diz o cientista.

Diaz e Rosenberg manifestam que em muitas ocasiões só se dá importância à hipoxia quando esta começa a dizimar os organismos que, em última instância, servem de alimento à população.

Como exemplo, eles citam o desaparecimento de algumas espécies ictiológicas e os surtos crônicos de epidemias bacterianas em outras.

Por outro lado, ao impedir o desenvolvimento de alguns habitantes dos fundos marítimos, como as amêijoas e alguns vermes, a hipoxia elimina uma importante fonte de nutrição para outros depredadores, assinala o estudo.

Segundo os cientistas, a chave para frear o aumento de zonas mortas é manter os adubos em terra e impedir que cheguem ao mar.

"É necessário que cientistas e agricultores trabalhem em conjunto para desenvolver métodos agrícolas que reduzam a transferência de nutrientes da terra para o mar", diz Diaz.

EFE

Moradia Popular promove oficina de Gestão Ambiental

A Coalizão pela Moradia Popular do DF, composta por mais de duzentas cooperativas, realiza, pela primeira vez no DF, uma oficina de Gestão Ambiental Urbana voltada para as mais de cinco mil famílias que vão morar na Etapa IV do Riacho Fundo II. Apoiados pela União, que doou o terreno, a COALIZÂO, em parceria com o Fórum das ONGs Ambientalistas do DF está realizando, desde o fim-de-semana de 3 de agosto, no SEST/SENAT de Samambaia, oficinas voltadas para a informação da comunidade em questões ambientais e de qualidade de vida buscando compatibilizar ocupação para moradia popular com sustentabilidade sócio-ambiental e dignidade dos moradores. O GDF, entretanto, que tem que tomar medidas para implantar a infraestrutura do novo bairro, vem postergando as obras, demonstrando que não tem interesse em projetos que envolvam moradia popular e de baixa renda, ao contrário do que tem feito no sentido de viabilizar o Noroeste, destinado a moradia de alta renda.
O Fórum das ONGs Ambientalistas vem ministrando as oficinas por meio de metologia interativa conduzida com vídeos, palestras e projeção de imagens de satélite do território do DF, abordando o tema da "GESTÃO AMBIENTAL URBANA".
As oficinas, com duração de quatro horas, têm sua realização executada nos finais-de-semana (sábados e domingos) em dois períodos - matututino e vespertino- sendo que, por final-de-semana, tem sido acompanhada por aproximadamente 1000 pessoas (duzentos e cinquenta por período), estando previsto um toatal de 5.500 ouvintes até meados de setembro.

Organização internacional pede providências para a defesa do DF como Patrimônio Cultural da Humanidade

MOÇÃO
Os presidentes e membros dos Comitês Nacionais do ICOMOS de Argentina, Brasil, Chile, México e Paraguai, conjuntamente com o Vice-presidente do ICOMOS para as Américas, reunidos na cidade de Foz do Iguaçu, Brasil, dias 29, 30 e 31 de maio de 2008, no Fórum Internacional Icomos Américas deliberam:
Considerando o teor do documento “Ameaças à Brasília, Patrimônio Cultural da Humanidade”, de autoria da Pró-Federação em Defesa do Distrito Federal, de maio de 2008 e de notícias veiculadas em periódicos de Brasília, Distrito Federal, resolvem recomendar ao ICOMOS Internacional que sejam solicitados ao Governo do Distrito Federal, Brasil:
a) Relatório detalhado sobre a adoção das recomendações constantes no documento elaborado pelos consultores Alfredo Conti, do ICOMOS e Hermann van-Hoff, da UNESCO, em Monitoramento Reativo realizado em 2001;
b) Estudo sobre os impactos diretos e indiretos sobre a área tombada de Brasília resultantes da adoção da proposta de Plano Diretor de Ordenamento Territorial – PDOT, que se encontra em fase de exame para aprovação pela Câmara Legislativa do Distrito Federal, Brasil;
c) Medidas legais e administrativas adotadas para a fiel e integral proteção de Brasília, Distrito Federal, da área inscrita na Lista de Patrimônio Mundial.
Carlos Pernaut
Vice-presidente do ICOMOS para as Américas
Alfredo Conti
Presidente do ICOMOS Argentina
Rosina Coeli Alce Parchen
Presidente do ICOMOS Brasil
José de Nordenflycht
Presidente do ICOMOS Chile
Jevier Villalobos
Presidente do ICOMOS México
Julio T. Decoud
Presidente do ICOMOS Paraguai
Anexos: Documento “Ameaças à Brasília, Patrimônio da Humanidade” e notícias veiculadas em periódicos.
Cópias para: Centro do Patrimônio Mundial – UNESCO; Governador do Distrito Federal; Presidente da Câmara Legislativa do Distrito Federal; Ministério Público do Distrito Federal; Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN; Secretaria de Cultura do Distrito Federal; Secretaria de Desenvolvimento Urbano do Distrito Federal; Representação da UNESCO em Brasília.

O DONO DA ÁGUA DA CHUVA NO DF SOMOS NÓS

D’Alembert Jaccoud, agrônomo e ambientalista (dalembert@cebrac.org.br)

As parcerias público-privadas (PPPs) recém anunciadas pelo governo do DF podem permitir a adoção de medidas de sustentabilidade ambiental que tragam benefícios econômicos e sociais à população, ao governo e ao empresariado da capital. Visando a finalização da infra-estrutura e a abertura de novas áreas para a expansão urbana, as PPPs devem garantir que a demanda por água seja atendida de modo racional e, ao mesmo tempo, salvaguardar os limitados mananciais de água potável disponíveis no DF. Reconhecidos os impactos da mudança climática global sobre os recursos hídricos e a necessidade de prevenir seu esgotamento, Brasília tem excelentes condições de adotar medidas práticas frente ao aumento da demanda e aos crescentes custos do seu abastecimento.

O projeto do setor Noroeste prevê uma população de 36.000 habitantes abrigada em 220 blocos com 19.400 apartamentos. Com um consumo médio de 200 litros por pessoa por dia, este bairro demandará 7.200.000 litros por dia para o consumo residencial; considerando a menor tarifa residencial (R$1,33 por 1.000 litros de água), esta população pagará uma conta diária de R$9.576,00 (ou R$ 30,27 por pessoa por mês). Diante deste quadro, torna-se tanto injustificável como insustentável que a expansão urbana da capital dependa do uso de água potável nas instalações sanitárias, irrigação de jardins, piscinas, lavagem de roupas, edificações, carros e outros usos. A PPP indica que os empresários farão a infra-estrutura e urbanização local, cabendo ao governo descontar estes investimentos do valor dos terrenos; a hora de pensar na conta de água e na preservação dos mananciais é agora, durante a definição dos projetos e contratos de interesse público.

O aproveitamento da água da chuva para consumo não potável é adotado nos Estados Unidos, Alemanha, Japão e outros países desenvolvidos. Há iniciativas no Paraná, Santa Catarina, São Paulo, nos estados do semi-árido e em outras regiões do país; o estado do Amazonas, que possui 74% da água doce do país, tem um programa estadual de aproveitamento da água da chuva. Vários municípios determinaram nas suas Leis das Cidades o aproveitamento deste recurso. No DF, nem mesmo a polêmica em torno da construção do Lago Corumbá IV levou esta alternativa a ser considerada pelos planejadores públicos e privados, apesar de que a diminuição da demanda da água potável fornecida pelas empresas de saneamento resulta na redução dos seus custos e na preservação dos mananciais para a universalização deste serviço básico.

A coleta e armazenamento de água de chuva é um processo simples e de fácil aplicação: a água é coletada através de calhas nas áreas impermeáveis das construções, normalmente o telhado, sendo filtrada e depositada num reservatório comum, onde é tratada e distribuída para uso não potável. O uso da água potável é retomado quando acaba a água da chuva armazenada. A viabilidade econômica desta tecnologia depende, basicamente, da qualidade e da quantidade da água da chuva. A chuva no DF se dá no período de menor poluição atmosférica, pois as queimadas agropecuárias ocorrem na seca. E cada metro quadrado de superfície do DF recebe anualmente entre 1.500 e 1.750 litros de chuva; assim, o consumo anual de cada habitante corresponde ao volume de chuva que cai sobre 50 metros quadrados. Para chegar às residências, no sistema atual, a água da chuva deve, primeiro, abastecer os mananciais (infiltrando-se no solo ou escorrendo pelo sistema de águas pluviais), de onde é então coletada, tratada (coagulação, floculação, decantação, filtração, desinfecção e fluoretação) e, finalmente, bombeada para as caixas de água dos usuários. Após todo este rigoroso e dispendioso processo, mais de 60% desta água potável é, então, utilizada para descarga sanitária e lavagem geral. O uso da água de chuva para fins não potáveis deve ser estimulado.

A água que cai do céu ainda não foi privatizada no Brasil e a tendência é de que as pessoas captem esta água para utilização própria. A Bolívia vendeu o sistema de águas de Cochabamba para a empresa norte-americana Bechtel, em 2000; o contrato impedia os moradores de coletarem a chuva, passando todos os recursos hídricos para a posse da empresa. Após violentos protestos populares, onde foi morto pela polícia um jovem ativista de 17 anos, a empresa desistiu do empreendimento.

Devemos

Devemos tomar conta da água da chuva em Brasília, pois ela ainda é nossa.

Brasília, maio de 2007



Minc já cede à pressão de lobby ruralista


Mauro Zanatta, de Brasília

Pressionado nos bastidores, o governo começa a aproximar suas posições políticas das demandas do lobby ruralista no Congresso. O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, já admite ceder em dois pontos considerados cruciais pelos ruralistas para acelerar a regularização ambiental e a criação de alternativas de exploração econômica na Amazônia.
Após reunir-se com o colega da Agricultura, Reinhold Stephanes, na terça à noite, Minc anunciou a intenção de permitir a recomposição de reservas legais em áreas diferentes das regiões desmatadas, uma antiga reivindicação dos ruralistas. Pela proposta, os produtores poderiam adquirir novas áreas de floresta para compensar o desmatamento ocorrido em suas fazendas ou "adotariam" áreas públicas de floresta nativa. Na Amazônia, o produtor é obrigado a manter 80% da área como reserva legal. No Cerrado, 35%. Nas demais regiões, a lei exige 20% de reserva.
"Estamos estudando a viabilidade legal disso. A recuperação teria que ser no bioma e no Estado de origem", disse Minc. "No caso da área pública, o produtor poderia adotar uma área referente ao que tem, por lei, que recompor. É bom para ele e bom para o governo".
Minc disse que o principal é "incentivar" a recuperação de áreas degradadas. "E incentivar quem quer fazer a reserva legal, mesmo em área fora da sua propriedade, porque não diminui a produção".
No lado da criação de alternativas à exploração predatória das florestas, Minc também admitiu permitir a recomposição de metade das áreas de reserva legal com o plantio de espécies exóticas, como o dendê. Nesse caso, seria "um triplo ganho", segundo o ministro: "Seqüestra carbono, produz um combustível que emite menos gases e ainda recupera áreas degradadas", disse. "Agricultura e meio ambiente estão cada vez mais próximos na sua percepção. Nós queremos produção sustentável, e agricultura quer a conservação dos solos e a proteção da água".
A convergência das posições de ambientalistas e ruralistas no governo tem, entretanto, opositores no Congresso. "É só um remendo. Se não votarmos a MP do novo código florestal, vamos continuar criando conflitos entre decretos, portarias e outras iniciativas", disse o deputado Moacir Micheletto (PMDB-PR), relator da Medida Provisória nº 2166, editada em 2001 pelo então ministro e atual deputado Sarney Filho (PV-MA) para ampliar a área de reserva legal.
De outro lado, o deputado Wandenkolk Gonçalves (PSDB-PA) defende a recomposição com o uso de espécies exóticas na Amazônia. "Daria para plantar quatro bilhões de árvores na Amazônia". Segundo ele, a solução é usar os 18 milhões de hectares abertos com pastagens e várzeas com plano de manejo e recuperação com tecnologia, além de permitir a recomposição de metade das áreas alteradas com plantas exóticas.
O governo avalia que os produtores têm sido punidos ao buscar a regularização ambiental de sua propriedade. E prepara a modificação de um decreto, hoje na Casa Civil, para evitar multas a quem quiser regularizar sua situação. "Essa legalização deve ser incentivada e não punida", disse Minc. (Com Agência Brasil)

Valor Online, 14/08/2008