Artigo publicado na Folha de São Paulo (Marina Silva).
O movimento ambientalista conquistou respeito e apoio por defender as imensas riquezas naturais do Brasil e questionar o crescimento a qualquer custo. Hoje, com a sociedade mais atenta, e disso tive prova durante os anos em que estive à frente do Ministério do Meio Ambiente, temos uma poderosa união de esforços que dá base política para reposicionar o modelo predatório de uso de nossos ativos ambientais.
Essa base deu suporte ao governo do presidente Lula para adotar medidas contundentes de freio ao desmatamento na Amazônia. Decreto de dezembro de 2007 determinou a regularização fundiária nos 36 municípios de maior desmatamento, a responsabilização das cadeias produtivas e o agravamento das sanções em caso de descumprimento de embargo. Em janeiro, foi anunciada a operação Arco de Fogo, da Polícia Federal e do Ibama. Em fevereiro o Conselho Monetário Nacional editou resolução que condiciona o crédito rural na Amazônia à regularidade fundiária e ambiental da propriedade. Essa resolução entrou em vigor em 1º de julho e certamente contribuiu decisivamente para os primeiros resultados positivos, ainda que parciais, desse esforço.
No entanto, ao mesmo tempo, surgem sinais preocupantes de mudança na postura do governo. Primeiro, a edição da Medida Provisória 422, que estimula a grilagem de florestas públicas na Amazônia; depois, o veto presidencial ao único dispositivo que disciplinava minimamente a aplicação da MP. Recentemente, o governo anunciou acordo que, na prática, reduz a reserva legal na Amazônia para 50% e permite o plantio de espécies exóticas. Anunciou também a redução do ritmo de criação de unidades de conservação e promete alterar o decreto recém-publicado que regulamentou a Lei de Crimes Ambientais.
Há 15 dias, manifestei meu estranhamento com declarações do ministro Mangabeira Unger, de que a legislação ambiental brasileira não fora construída "para valer". Estava em dúvida se o ministro expressava alguma nova visão do governo federal sobre política ambiental. Os sinais aqui relatados reduzem o espaço da dúvida.
Para a sociedade brasileira, que avalizou as corajosas medidas de combate ao desmatamento e recebeu de forma entusiasmada a declaração do presidente de que não haveria retrocesso na política ambiental, será difícil aceitar mudanças na contramão do que foi dito há apenas três meses. Caso o compromisso assumido pelo presidente simplesmente tenha sido sido ignorado pelos ministérios que deveriam zelar por ele, resta a esperança de urgente correção de rumos.
(Fonte: Folha de São Paulo - SP)
quarta-feira, 27 de agosto de 2008
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